19 ago - 2017 • 15:00 > 19 ago - 2017 • 19:00
19 ago - 2017 • 15:00 > 19 ago - 2017 • 19:00
Proposta/Provocação filosófica
(por Bruno Cava)
Para o filósofo Gilles Deleuze, a virada da
modernidade à pós-modernidade não se deu numa fratura estrondosa, quase como um
acontecimento transcendente, tal como, por exemplo, em Adorno, que perguntou
como seria possível ainda fazer poesia depois de Auschwitz. Para Deleuze, essa
virada, que se caracteriza pela passagem paulatina das sociedades disciplinares
às de controle, foi um acontecimento da ordem do imperceptível. Algo aconteceu
e os problemas mudaram. Os Controlatos não atuam apenas no confinamento e
formação dos sujeitos, como teorizado por Foucault em termos de poder
disciplinar, mas diretamente na produção de subjetividade, sem cancelar a
liberdade nem negar o desejo, mas *por dentro*, *no contínuo*, *no aberto*.
Como afirmar o desejo e ao mesmo tempo resistir, sem cair numa concepção
negativa de diferença? E como conjugar ruptura e imanência? Com a virada
maquínica, se tornam impotentes as análises de conjuntura que interpretam o
jogo de forças no presente para deliberar a ação de um sujeito histórico apto a
realizar a tendência transformadora. A própria ideia de conjuntura entra em
crise, pois se desfez o liame que poderia vincular o sujeito da análise com o
sujeito da ação (seja ele o povo ou o proletariado), o que Deleuze chama, a
partir dos seus dois livros sobre o cinema, de "ruptura do esquema
sensório-motor" ou "crise da imagem-ação". Em vez então de
voltar à velha definição da justa linha política do "que fazer?",
segundo o primado do otimismo (desencantado) da vontade, é preciso perguntar
antes pelas condições do agir. Antes da conjuntura enquanto atualidade,
perguntar pelo campo virtual em que algo como uma subjetividade possa existir:
como voltar a ser capaz de fazer o que quer que seja? De sentir, de amar? Eis
aí a interpelação que o pessimismo alegre de Deleuze coloca ao desafio da
transformação nas condições maquínicas das sociedades de controle.
Rua Aarão Reis, 542 Centro
Belo Horizonte, MG
Bruno Cava
Blogueiro e professor de cursos livres no Rio de Janeiro, mobilizando autores como Deleuze, Guattari, Negri e Spinoza, publicou "A multidão foi ao deserto" (AnnaBlume, 2013) e organizou "Amanhã vai ser maior" (2014) com Giuseppe Cocco, "Podemos e Syriza: experimentações na borda das lutas" (2015) com Sandra ArencónBeltrán e "A Terra Treme" (2016), com Márcio Pereira, com artigos em publicações como South AtlanticQuarterly, Le Monde Diplomatique, Multitudes, Chimère, The Guardian, Commonware, Al Jazeera e Alfabeta2.
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