A espécie humana tem se distinguido pela faculdade privilegiada de produção e construção de interpretações e saberes, mesmo que represente apenas uma parte do complexo sistema que constitui a Terra. Esses saberes, considerados tradicionais, são repassados, desde os primórdios, de forma oral e experimental de geração em geração, pois, nos grupos humanos que vivem próximos à natureza, os mais velhos sempre tiveram a função de ensinar os conhecimentos que sustentam a vida comunitária de modo prático.

Muitos desses saberes são construídos por meio da observação atenta da natureza, resultante da vida no campo, e são acumulados e reorganizados permanentemente ao longo de milhares de anos de convivência e interação com o ambiente. É igualmente por meio do mundo material e simbólico, exterior e interior, que a relação cérebro-espírito encontra as bases para a sua complexificação e a produção do conhecimento.

A partir do pressuposto de que a relação homem/meio é paradoxal, simultaneamente totalizante e fragmentada, pautada pela incerteza e aprendizagem de padrões e ordens já configurados no meio, o Seminário Brasileiro Educação e Saberes da Tradição problematizará duas estratégias distintas e complementares de produção de conhecimento: a Ciência e os saberes da tradição. Expor, sistematizar e discutir os saberes da tradição têm o sentido de conservar as antigas sabedorias das populações que sustentam a vida no planeta.

Trata-se de uma discussão teórico-prática fundamentada numa Antropologia de base transdisciplinar, cujo objetivo primordial é o diálogo entre os saberes científicos e os saberes da tradição. O Seminário dará destaque às matrizes de pensamento marcadas pela relação entre razão e sensibilidade, natureza e cultura, parte e todo e, sobretudo, a modos de pensar capazes de conceber o método científico como estratégia e não como um programa de pesquisa pré-definido.

O Seminário identificará cenários, fenômenos, interpretações e práticas socioculturais que se constituem em reservas de complexidade da memória biocultural da espécie humana, como destacam Toledo e Barrera-Bassols (2008). Tratará dos saberes construídos pelos intelectuais da tradição acerca da fauna, da flora, dos fenômenos físicos, da saúde, das práticas de cultivo, do manejo de recursos, da preservação da biodiversidade e das concepções de vida e de mundo que reverberam na Educação, especialmente na Educação ribeirinha, indígena, quilombola e rural, em direção a um projeto educativo que inclua os saberes das populações tradicionais no currículo escolar.

De uma perspectiva epistemológica, o Seminário problematiza a natureza da universalidade e da diversidade dos conhecimentos humanos em sua pluralidade. Advoga sobre a necessidade de uma Educação que religue não apenas áreas disciplinares internas aos conhecimentos científicos, mas, e sobretudo, entre esses conhecimentos e os saberes da tradição, como preconizam as pesquisas científicas já desenvolvidas pelos professores Maria da Conceição Xavier de Almeida e Carlos Aldemir Farias, na UFRN e na UFPA, respectivamente.

Vinculado aos propósitos do pensamento transdisciplinar, o Seminário apresenta como finalidade ampliar as reflexões sobre Educação e Saberes da Tradição, por meio da produção científica do Grecom e do GPSEM no período de 25 anos (2000-2024). Além disso, celebra uma parceria de trabalho desenvolvida entre a UFPA e a UFRN, por meio dos dois grupos de pesquisa (GPSEM e Grecom), que consolida as investigações stricto sensu desenvolvidas sobre os saberes da tradição, com ênfase na Educação, Educação em Ciências e Educação Matemática.

Marcado pela diversidade temática e de áreas de conhecimento, o Seminário contempla profissionais das Ciências Noológicas, das Ciências da Vida, das Ciências Humanas e Sociais e das Ciências da Educação, representando duas regiões geográficas do Brasil: Norte e Nordeste. São pesquisadores que produziram suas teses de doutoramento junto ao Grupo de Pesquisa Práticas Socioculturais e Educação Matemática (GPSEM), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas da Universidade Federal do Pará (UFPA) e ao Grupo de Estudos da Complexidade (Grecom), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

O intercâmbio interinstitucional entre a UFPA e a UFRN se amplia com investigações congêneres, a exemplo da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), por meio da professora Márcia Regina Farias da Silva e seus estudos e pesquisas acerca da Ecologia, meio ambiente e gestão ambiental. E também da Universidade Federal do Tocantins (UFT), por meio do professor Kaled Sulaiman Khidir e as pesquisas realizadas sobre formação de professores de Matemática na comunidade quilombola Kalunga do Mimoso e no investimento no curso de licenciatura em Educação Escolar Quilombola.

A promoção e realização do Seminário é uma parceria entre o Grupo de Pesquisa Práticas Socioculturais e Educação Matemática, da UFPA, e o Grupo de Estudos da Complexidade, da UFRN. As atividades acontecem nos dias 3 e 4 de abril de 2025 na modalidade presencial e terão lugar no Palacete Pinho, um edifício histórico do final do século XIX, pertencente à Prefeitura Municipal de Belém, a quem agradecemos pela acolhida durante os dias do evento. 

O Seminário conta com 13 palestrantes convidados. São professores pertencentes a nove instituições de ensino superior e da Educação Básica de distintas áreas de conhecimento: Antropologia, Biologia, Ciências Sociais, Física, Geografia, Licenciatura Integrada, Matemática e Pedagogia. A programação contempla a conferência de abertura, proferida pela professora Maria da Conceição de Almeida, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação desta universidade. Ademais, estão programadas 12 palestras de professores pesquisadores que realizaram pesquisas sobre o tema Educação e Saberes da Tradição, uma exposição de banners e lançamento de livros. As atividades acontecerão pela manhã, das 8h30 às 12h, e à tarde, das 14h30 às 18h.

Importa destacar que este Seminário faz parte de um projeto de pesquisa que vem sendo desenvolvido por mim junto ao Instituto de Educação Matemática e Científica da Universidade Federal do Pará desde 2014 e tem se desdobrado ao longo dos anos em publicações científicas e na orientação de trabalhos acadêmicos (mestrado e doutorado), no âmbito da linha de pesquisa Docência e Diversidade, do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas, da UFPA.

Agradecemos o apoio do Núcleo de Arte, Cultura e Educação (NACE) da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de Belém pela reserva do Palacete Pinho. A todas as instituições envolvidas na realização do evento: UFPA, UFRN, UFT, UERN, IFPA, IFRN, IFMA, Semec Belém e à Prefeitura Municipal de Ponta de Pedras, em nome da Secretaria Municipal de Educação. Ao Instituto de Educação Matemática e Científica, em nome do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas da UFPA. À Editora Livraria da Física, ao Editorial Flecha do Tempo e ao Movimento Alternativo Goto Seco.

E, ainda, aos intelectuais da tradição, em especial, Chico Lucas, da Lagoa do Piató, Rio Grande do Norte, e Dona Rosinha, da Ilha de Marajó, no Pará. A Sofia Cozzi, pela pintura em aquarela, preparada especialmente para a composição deste programa. Obrigado pela delicadeza artística. Por fim, mas não menos importante, aos professores palestrantes, que confiaram na realização deste Seminário, que, mesmo sem recursos materiais e financeiros, tornaram possível sua concretização.

Desejamos boas-vindas aos convidados e participantes do primeiro Seminário Brasileiro Educação e Saberes da Tradição. Desejamos vida longa ao evento e que, nesses dois dias de trabalho, possamos trocar ideias e dar visibilidade ao que temos produzido acerca do tema no interior das universidades nos últimos 25 anos.

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